segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Anoiteço - Allyson Alves

A cada dia reconheço
Que careço, padeço e anoiteço.
Impressiona-me quase não haver medo
Além do medo por não temer o que vejo.

E vejo um homem sem medo do futuro,
E de futuro nebuloso, talvez inseguro,
Talvez seja bom não saber do futuro
Mal sei deste homem que sou: nebuloso, inseguro.

Estranho não ter insônia.
Estranho meu bom humor.
Estranho os cabelos compridos, o olhar caído
E na boca nenhum sabor.

Reconheço que careço, padeço e anoiteço.
No raiar do meu dia, sob o sol, nada vejo.
Na escuridão da minha vida me aconchego,
E apareço na janela para um novo recomeço.

E recomeço hoje. E amanhã repito o mesmo.
Aos poucos vou perdendo o medo de quando careço
Até já não carecer ter medo ou futuro,
Se mesmo com o sol eu anoiteço.

Estranho não ter insônia...
E acordar sempre de bom-humor.

Que nem água - Allyson Alves

“Em tempos de maré baixa
A vida fica que nem água:
Insípida, inodora e incolor.”


“Vida escoada. Chorada.
E no seu leito derramada.
Cadenciada na correnteza irregular
Da geografia do seu curso.
A cada curva, cada pedra, e,
Cada queda, uma aventura.
Na correria das corredeiras
Dessa vida suada, de encharcar,
Pouco tempo se tem para perceber
O encher d’água dos olhos,
E o bem-estar mareado.
E a vida, chuva de mistérios,
Segue malhada, segue pingada,
E segue molhada de tempestades.
E o triunfo da vida é
Faze-la não se conter, até transbordar.”

Querenciando - Allyson Alves

Não sei ao certo o que eu realmente quero.
Eu sei exatamente aquilo que eu não quero, e,
Ainda assim, há de se aproveitar alguma coisa disso também.
Não sei quem eu quero, e bastava saber se eu quero,
Saber se realmente quero, já seria um bom começo.
Ainda que não durasse, como todo o resto não durou,
E como tudo não dura pra sempre.
Não sei quem quer o quê, e nem se nesse “quê” eu me incluo.
E nem se haveria jeito de querer a pessoa “quem”
Que também não deve saber o que quer.
Eu não sei o que realmente quero,
Mas sei exatamente tudo o que não quero.